quarta-feira, 18 de maio de 2011

Regardez-moi: da honestidade à eugenia com o site Beautiful People



Por Maria Eduarda Ornellas






Quando Carla Bruni cantou que era a mais bonita do quarteirão, quem ouviu teve duas reações. Uns já foram se desesperando, procurando, querendo dar uma boa espiada, “Onde? Onde?”. Mas outros, indignados, responderam logo “Oras, eu também! Eu também sou o mais bonito do meu bairro”. E aí, os mais bonitos de cada bairro formaram os mais bonitos de cada cidade, que formaram os mais bonitos de cada país, e, finalmente, os mais bonitos do mundo. Mas como todas essas beldades iriam se conhecer? A resposta é simples: por meio de um site de relacionamento que só permitisse a entrada dessa elite da beleza. E assim estava criado o Beautiful People. Não que a primeira-dama francesa tenha alguma coisa a ver com isso. A ideia veio do dinamarquês Robert Hintze e do britânico Greg Hodge, que justificam seu projeto como uma única e simples palavra: honestidade.

Para seus fundadores, a premissa do BP, como o site é mais conhecido, é a de que “as pessoas naturalmente preferem rostos atraentes”. A rede de relacionamento, então, propõe-se apenas a criar um espaço onde não seja preciso procurar muito. “Todos os que estão lá são bonitos. O Beautiful People é uma reserva de caça magnífica de leopardos e gazelas”, garante Hintze. Seu co-fundador assegura que quando criaram o site, em 2002, os dois não estabeleceram nenhum padrão de beleza, já que cada novo membro passa por um processo democrático para ser aceito. Basta colocar uma foto, e todas as pessoas que já participam da comunidade podem decidir, por meio de votos, se o candidato é bonito o suficiente para figurar entre eles.



Embora Robert Hintze defenda que, assim, “entregou o poder às pessoas”, uma força maior se fez necessária em janeiro de 2010. Após as festas de fim de ano, cerca de 5 mil usuários do Beautiful People foram expulsos, de um dia para o outro. Não houve votação, a administração do BP é que foi a responsável pela guilhotina. A justificativa foi tão direta quanto a proposta do site: esses membros haviam se descuidado durante as férias, supostamente ganhando peso e, assim, perdendo o direito de estar entre os BP. Hintze afirmou ter recebido diversas reclamações sobre a queda nos padrões no site, mostrando que os próprios usuários exercem um espécie de polícia.

É uma função que exercem com prazer. Nos diversos fóruns da rede, não é raro ver denúncias contras perfis falsos e reclamações contra a entrada de membros que não sejam nada menos que magníficos. Os usuários levam a sério – seríssimo – a exclusividade prometida por Robert Hintze e Greg Hodge, que garantiram que “no Beautiful People não seria preciso vasculhar pelo lixo”. As declarações encontradas na rede, então, não são menos fortes que as dos próprios fundadores.

É isso que preocupa o pesquisador David King, do Human Genetics Alert. Para ele o Beautiful People representa uma tendência eugênica muito perigosa para a sociedade. Não apenas por conta de comentários como o do BP Luiz Miguel, 27 anos, que afirmou não votar a favor de mulheres “do tipo ordinário, do povo”, mas também por conta de uma tentativa que o site fez no ano passado. Em junho de 2010, o Beautiful People lançou o Beautiful Baby, um banco virtual de esperma e óvulos a que tanto membros quanto não-membros podiam ter acesso. Segundo Hintze, a ideia era dar uma chance aos feios, possibilitando a criação de bebês bonitos, o que, de acordo com o fundador, é o que todo o pai quer.

Antes de ser extinto com um reforma do site no início deste ano, o serviço funcionava como um fórum. Os interessados em receber uma doação explicavam o que procuravam e esperavam a resposta de alguém que se encaixasse nas características. Então era só combinar a clínica e, voilà, o mundo ganhava mais um BP. Foi o auge da honestidade proposta por Hintze e Hodge. Nem os bebês estavam a salvo.

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